Lendo as últimas notícias, fiquei intrigado, mas não surpreso, ao saber que o Congresso aprovou uma mudança que enfraquece a Lei da Ficha Limpa, algo que a população conquistou com muito esforço para combater a corrupção. Enquanto o país inteiro estava com a atenção voltada para o julgamento de um ex-presidente, alguns políticos aproveitaram a distração para mexer nessa lei tão importante, o que levanta sérias dúvidas sobre suas reais intenções.
A nova proposta não diminui a pena de inelegibilidade de oito anos, mas muda a forma como o tempo é contado. Pelo que entendi, em vez de o prazo de oito anos começar a valer depois que o político cumpre sua pena, ele passaria a ser contado a partir da condenação. É como se, em vez de você começar a contar o tempo de um castigo depois que termina a lição de casa, você começasse a contar enquanto ainda está fazendo a lição. Isso pode reduzir o período em que a pessoa fica impedida de se candidatar. Na prática, alguns políticos podem voltar a concorrer mais cedo.
Além disso, a proposta inclui uma regra que estabelece um limite de 12 anos para a inelegibilidade e exige a comprovação de que o político teve a intenção de cometer atos de improbidade, o que pode abrir brechas. Como as notícias apontaram, a deputada Dani Cunha (União-RJ), filha do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, foi a autora desse projeto. Essas mudanças têm o potencial de beneficiar o próprio Eduardo Cunha, o que torna a situação ainda mais questionável. É aqui que o absurdo entra, com o sarcasmo necessário: é como se a gente pegasse um ladrão em flagrante, com a mão na massa e o produto do roubo na mochila. Aí, em vez de ser preso, ele simplesmente fala para o policial: “Eu não tinha a intenção de roubar! Pensei que era um presente.” E, pasme, ele só seria condenado se o policial conseguisse provar, com absoluta certeza, que o ladrão sabia que estava roubando.
É uma ideia tão absurda que a gente se pergunta: quem, em sã consciência, ao ser pego cometendo algo errado, vai admitir que sabia o que estava fazendo? A realidade é que a maioria vai alegar inocência, falta de conhecimento ou qualquer desculpa para se livrar da punição. Essa regra, na minha opinião, parece mais um atalho para livrar a cara de quem cometeu um ilícito.
Um exemplo conhecido de como a inelegibilidade temporária pode não ser suficiente é o caso de Fernando Collor. Ele teve seu mandato de presidente cassado em 1992 e perdeu seus direitos políticos por oito anos. No entanto, depois desse período, ele conseguiu voltar a ocupar cargos públicos. Anos depois de seu retorno, o Supremo Tribunal Federal (STF) o condenou por crimes como corrupção e lavagem de dinheiro, em um desdobramento da operação Lava Jato, com base em fatos que ocorreram durante o período em que ele já era senador. A condenação o levou a ser preso em abril deste ano.
O caso dele mostra que o problema não é apenas o crime em si, mas a possibilidade de que políticos, mesmo após cumprirem a pena de inelegibilidade, voltem a cometer atos ilícitos. A Lei da Ficha Limpa foi criada para ser uma barreira, mas as mudanças propostas enfraquecem essa proteção.
Desde criança, sempre ouvi que não importa o tamanho do crime, roubar um palito de fósforo ou um milhão de reais, a atitude é a mesma: um erro. E a Lei da Ficha Limpa surgiu para garantir que as pessoas que cometem esses erros sejam responsabilizadas e fiquem longe da política por um tempo.
Particularmente, acompanho a política há várias décadas e, na minha opinião, é preciso ir muito mais longe. Acredito que cada político que for condenado por qualquer ilícito contra a nação deveria ser impedido de concorrer a qualquer cargo, mesmo que fosse para síndico. Se isso fosse uma realidade, ao menos a metade dos atuais políticos não estaria ali, votando esse tipo de absurdo.
Essas alterações parecem ir contra a ideia de que o crime não compensa, abrindo a porta para que políticos com histórico de problemas voltem ao poder. Isso me faz questionar se o bem comum ainda é a prioridade no nosso país.
Agora, a decisão final cabe ao presidente Lula. Eu espero que ele tome a atitude de vetar esse projeto. Também torço para que a população abra os olhos e anote o nome de cada um dos congressistas que, sempre que podem, legislam em benefício próprio. (Por @LucianoBaixinho)