Um texto cheio de incógnitas, talvez um pouco desconexo, como quem busca compreender o próprio coração. “Para os sonhadores de plantão” — assim começava aquela simples, mas singela mensagem. O mundo e suas muitas faces: as lágrimas de todos os dias, as tristezas de todos os olhares.
Em certos instantes, os versos ganhavam profundidade e revelavam as condições humanas — a força e a fraqueza, o esplendor e a miséria, o tudo e o nada que nos habitam. Essa dualidade do sentir, o ser e o eu diluídos, ecoam a fragmentação de que falava Fernando Pessoa: “Sentir? Deixa lá o sentir! Sente quem sabe pensar que sente, em vez de pensar que pensa.”
Contam-se histórias, declamam-se versos permeados de alma. Nossos poetas e poetisas são arautos dos sentimentos, apanhadores de flores em jardins distantes, semeadores de sonhos no fértil chão da esperança. Mas há também as dores, os lamentos, as feridas invisíveis que maculam a dignidade e adoecem o espírito.
Uma nuvem parecia querer guardar em si apenas um verso, um verso para alimentar o silêncio. Não culpo a natureza por calar-se, nem a poesia por ferir-me com seus versos cortantes. É no silêncio que me encontro — e nele me perco. Ele me convida a estar ao seu lado, ora inteiro, ora fragmento.
Às vezes os versos me fazem refém; outras, o silêncio me devolve ao mundo. Esse silêncio mora em mim: nas tardes vazias, nas manhãs cheias de mim, que pedem para transbordar. É ele quem me aconselha quando o barulho em mim se torna insuportável. Apego-me aos seus zelos, refugio-me na sua profundidade e, depois, afago a vida com a intensidade dos longos versos.
As mãos se distraem e tocam as estrelas, como se entre o fim e o início houvesse sempre um novo momento à espera. Lágrimas e suor se misturam nos dias angustiados. De cada instante resta o fim e o começo, porque a noite sempre retorna. É como se todas as lágrimas viessem de um único olhar, como se lágrimas e sorrisos fossem a mesma face — poetizando a leveza que afaga sob o olhar da alma.
O ser e o eu, entre o nada, componho outros versos e sublimam a mesma poesia. A essência de tudo permanece sob os encantos do que ficou: uma flor entre espinhos, abelhas em algazarras, chuvas de ontem irrigando sentimentos e sementes germinando pétalas de futuros versos.
Os olhares inquietos tentam silenciar antes da chegada da noite. E, quando a noite vier, as luzes se acenderão, e os olhos ainda desejarão ver o dia — e nele se perder.
Leve, tão leve como o pensamento que quer voar na vastidão dos sentimentos. Tão bom é esse quase segundo que ocupa o meu ser por inteiro.
Não falo o que penso, deixo o silêncio conduzir-me pelos caminhos vastos dos sentimentos. Amanhã cedinho, não esqueça de regar o seu jardim. Sob o voo das abelhas e o colorido das flores, a vida se alimenta e nutre o ser que se humaniza num enlace cósmico. O jardim, refúgio da alma, é a esperança renovada, pois, nas palavras de Rubem Alves, “Ostra feliz não faz pérola”. É na dor e na superação que a beleza da vida germina. Uma criança sorri, e o seu sorriso aquece o sol.
Nas margens de uma tarde qualquer, a mesma mensagem envolta em sentimento — sentimento profundamente semeado entre os sonhadores de um mundo possível. Ainda se pode vê-la entre as lágrimas, adormecida no orvalho que nutre as noites.
Uma mensagem cheia de sentimentos adormecidos no coração da humanidade. Ainda que as noites sejam tão escuras e os dias tão pesados, há ainda um sentimento que se volta sobre si mesmo, protegendo-se dos ventos fortes e da ganância que consome o ser humano nessa guerra de todos contra todos.
Agora, a mesma mensagem — uma carta aos seres humanos de boa vontade. Uma lição de amor, vivida e vivenciada como um ato revolucionário de sentimento humano. A graça dos dias está nas bem-aventuranças de todos os tempos. Entre as dores do mundo, mãos estendidas partilham o mais profundo sentimento: a ternura que nos faz humanos e revela quem somos nesta terra de abundâncias.
Somos sentimentos. O coração é a nossa casa, sempre aberta.
Luiz Carlos de Proença – Autor dos livros: O sol nas margens da noite e A pele do vento