“Amai a justiça vós que governais a terra (Sab 1,1), porque a justiça é imortal” (Sab 1,15). Esta mensagem da Sabedoria nos convida a refletir sobre o papel de quem governa e de quem é governado. Na prática, a justiça, que deveria ser imortal, parece muitas vezes perder-se no jogo do poder. E onde entra o nosso voto nisso tudo? “O voto não tem preço, tem consequências”.
A velha política, marcada pelo clientelismo e pelos interesses pessoais, parece resistir ao tempo, enquanto a boa política, aquela que visa o bem comum, luta para sobreviver. Já a má política é a expressão dos desvios éticos e morais, que corrompem a justiça e o bem-estar social. A política em si não tem lado, mas o político sim. Tudo é uma questão de prioridades. Quais prioridades? A prioridade deve ser governar para todos, mas há quem necessite de um outro olhar. Governar é fazer justiça.
Nossa participação na sociedade, convivendo nela, se dá por meio de relações políticas. Estamos sempre tomando decisões que, direta ou indiretamente, influenciam nossa vida como sociedade e como comunidade. No entanto, a política em nosso país é marcada pelo fisiologismo, essa relação imoral entre o poder político e as decisões que favorecem grupos ou a base aliada em troca de interesses privados, em detrimento do bem comum. Essa prática está enraizada em nossa política, tornando-a uma negociata que já se tornou praxe.
Será que política é apenas um conceito de poder? E que poder? Quem é servido por esse poder? Quem se serve desse poder? Maquiavel, sempre provocador, nos lembra que a política tem duas caras: a pública e a dos bastidores. É nos bastidores que a verdadeira face do poder se revela, longe do alcance do cidadão comum. O que se esconde por detrás do poder? O que o poder esconde de nós?
A política nos manipula? Ou seria o poder manipulado pela política? Ou talvez sejam os políticos que manipulam, usando a política como uma ferramenta que obedece a ordens preestabelecidas? Somos manipulados? Somos ingênuos? A política e o poder. O poder da política. Eu, político? Imagina! Meu universo é outro. E o seu? Você precisa se sustentar. De onde vem o seu sustento? Todos nós precisamos trabalhar para sobreviver, nisso acredito que há consenso.
Bertolt Brecht, dramaturgo, romancista e poeta alemão, dizia que o pior analfabeto é o analfabeto político: “Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas.“.
E a política como deveria ser? Platão aponta para o mundo das ideias, das coisas perfeitas. O ideal humanista, a perfeita sintonia entre o que é e o que deveria ser. O idealismo político, o bem comum. A política da divergência: divergir para convergir. O ideal da política é promover o bem comum.
Maquiavel não me deixa quieto, provocando-me a ponto de acreditar que a política é um jogo. Um jogo marcado pela sordidez, em que as regras sempre favorecem quem detém o poder. Ética? Moral? Não sei. Talvez seja descrença minha, mas atualmente essas duas palavras parecem não fazer parte da política. Será que sempre foi assim?
Será que quem não é candidato pode se desinteressar totalmente pelo assunto, tendo apenas o compromisso de eleger alguém, qualquer um? Acredito que não. Foi só uma provocação. A sociedade está mais consciente de que nosso compromisso vai muito além do voto. Votar é apenas o começo. Nossa cidadania exige mais do que o ato de escolha; ela pede participação contínua, questionamento e engajamento. O exercício da cidadania depende de como o poder político está estabelecido.
Apesar do descrédito na política — e até com certa razão, pois a classe política, em sua maioria, trabalha para seu próprio favorecimento e de seu grupo —, mesmo na desconfiança, preciso ter esperança. Precisamos acreditar na força da união e no poder de construir uma sociedade mais justa e fraterna. A justiça, como nos lembra a Sabedoria, é imortal — cabe a nós mantê-la viva em nossas ações e escolhas.
Luiz Carlos de Proença Conselheiro Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência Capão Bonito-SP – Autor do livro – O abraço do tempo –